Bairro da Boavista

em colaboração com Raúl Moura

Introdução
A condição isolada do bairro, construído originalmente nos anos 40, é a génese das suas qualidades e falhas: por um lado, a proximidade à natureza e a baixa densidade de construção são qualidades típicas dos subúrbios residenciais; por outro lado, a dificuldade de acesso a partir do centro da cidade perpetua o estigma de “bairro problemático”.
Os realojamentos em construções em altura, experimentados nos anos 80 e 90, provaram ser inadequados: os edifícios são o espelho dos problemas de adaptação dos novos residentes com o consequente abandono dos espaços colectivos. A falta de identificação com os chamados “contentores” contrasta com o bairro de casas unifamiliares, onde é visível uma ocupação intensa dos espaços exteriores – com sofás, gaiolas de pássaros, plantas, cortinas, azulejos, etc, – transportando o interior da casa para o espaço colectivo.

O novo Bairro
A rotação da implantação dos lotes responde à topografia acidentada, criando uma rede pedonal que permite que todas as casas tenham ligação visual com o pinhal de Monsanto em ambas as fachadas.
Os acessos a cada edifício ficam resguardados das vias de circulação automóvel permitindo um usufruto directo do espaço público pelos habitantes, e oferecendo um acesso pela rua aos talhões cultiváveis, que acompanham igualmente a topografia.
As ruas são desenhadas utilizando o conceito de ‘espaço partilhado’, vias onde não existem barreiras de nível, e onde é dada prioridade permanente à circulação do peão sobre o automóvel. A deslocalização de lugares de estacionamento, em linha com a acção levada a cabo pelo município no resto da cidade, contribui decisivamente para reforçar esta estratégia, libertando espaço no perfil da rua para usufruto dos habitantes. Todos os lugares previstos no plano, para habitantes e visitantes, estão localizados a distâncias curtas dos lotes.
Cada edifício ganha uma rua que vence o declive do terreno com degraus, um modelo tradicional utilizado no centro de Lisboa, que potencia a apropriação e identificação dos moradores com a sua rua, cuja identidade complementa a do prédio.

O edifício rua
A tipologia dos edifícios, com generosos alpendres orientados a sul, oferece um palco individual a cada casa para ser ocupado ao longo do tempo, através da utilização quotidiana, ou através da expansão futura da área interior habitável, dentro dos limites da área edificável.
O alpendre é a extensão natural do espaço interior das casas, e desempenha um papel determinante na regulação passiva do conforto térmico das habitações, sombreando no verão, e permitindo ganhos solares no inverno.
Esta fachada inacabada espelha a diversidade dos habitantes, funcionando como filtro em relação ao exterior: uma zona de mediação entre o domínio privado e o público, aberta à ocupação e personalização dos moradores.

Tipologias
Todas as casas têm uma relação directa entre a cozinha e um talhão agrícola privado que também pode ser acedido desde a rua pedonal. Os apartamentos de um piso estão localizados no piso térreo enquanto que os apartamentos duplex estão localizados nos pisos superiores. O layout interior das habitações é compacto e racionalizado ao máximo através da eliminação das áreas de circulação.

programa: reconstrução de bairro habitacional arquitectura: João Fagulha, João Ruivo, Raquel Oliveira, Raúl Moura imagens 3d: Panoptikon cliente: Município de Lisboa estimativa: 420.000€ (edifício-tipo) área: 847,80m2 (edifício-tipo) ano: 2013 localização: Lisboa, Portugal fase: concurso, 2ºprémio